Educação

MPF quer fim de violação de direitos em escolas públicas militares da Bahia

29 de Julho de 2019 - Redação Cabula agora
[MPF quer fim de violação de direitos em escolas públicas militares da Bahia]

Atualmente, 63 escolas públicas municipais na Bahia, em 58 diferentes cidades, executam esse tipo de parceria.

Escolas públicas municipais no estado da Bahia que passaram a ter a gestão compartilhada com a Polícia Militar não poderão mais restringir indevidamente a liberdade de expressão, intimidade ou vida privada de seus alunos, seja por meio de imposição de padrões estéticos, pelo controle de publicações levadas pelos estudantes para escola ou feitas em redes sociais, ou proibição à participação em manifestações – entre outras restrições consideradas pelo Ministério Público Federal como inconstitucionais e que não têm potencial de melhorar o ensino.
Na sexta-feira (26) o MPF, por meio da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão na Bahia, encaminhou uma Recomendação sobre o tema a prefeituras e a todas as escolas públicas do estado que mantêm cooperação técnica com a Polícia Militar para a aplicação da metodologia dos colégios da PM nesses estabelecimentos de ensino. Atualmente, 63 escolas públicas municipais na Bahia, em 58 diferentes cidades, executam esse tipo de parceria.
De acordo com a Recomendação, as escolas com gestão compartilhada entre os municípios e a Polícia Militar não deverão impor aos estudantes padrões estéticos quanto a cabelos, unhas, forma de vestir ou obrigatoriedade de uso de bonés ou boinas, dentre outros.
Essas unidades também não poderão fiscalizar ou proibir comportamentos neutros dos alunos que não venham a afetar diretos de terceiros ou interesses públicos – como consta no regimento disciplinar de algumas delas –, tais como frequentar local de jogos eletrônicos, usar óculos esportivos, namorar, ou qualquer outro tipo de proibição baseada unicamente em moralismo e incompatível com o Estado Democrático de Direito.
O texto também determina que seja respeitado o direito à liberdade de expressão dos estudantes, que não poderão sofrer controle acerca do tipo de publicação que levam à escola ou fazem em redes sociais, ou mesmo quanto à participação em manifestações – sejam políticas ou reivindicatórias, dentro ou fora da escola, fardados ou não.
Além de estabelecer que os termos da Recomendação devem receber ampla divulgação, o Ministério Público Federal orienta ao Comando da Polícia Militar da Bahia que se abstenha de firmar ou colocar em execução novos acordos que resultem na aplicação da metodologia dos Colégios da PM em escolas públicas nos termos em que essa parceria vem sendo feita, por “incompatibilidade com a Constituição Federal, convenções internacionais, leis e resoluções do Conselho Nacional da Educação, além de importar em violações múltiplas de direitos fundamentais de crianças e adolescentes”, destaca o procurador regional dos Direitos do Cidadão na Bahia, Gabriel Pimenta.
Os órgãos oficiados terão até 15 dias para informar as medidas adotadas para o cumprimento da Recomendação, ou as razões para o seu não acatamento. Uma cópia do documento também foi enviada ao Governador do Estado e aos Tribunais de Contas do Estado e dos Municípios, a fim da realização de controle de suas competências quanto à legalidade, legitimidade e economicidade da política pública em questão.
Restrições e rotina militar
No estado da Bahia, cooperações técnicas para a militarização de escolas públicas municipais estão em funcionamento desde 2018. Embora a Constituição Federal determine, em seu art. 206, que os profissionais da educação escolar das redes públicas ingressarão na carreira exclusivamente por concurso público, o termo de cooperação permite à Polícia Militar nomear livremente militares inativos para funções nas escolas municipais.
A indicação também se dá à revelia do que estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação quanto aos requisitos para atuação na educação básica, visto que não são feitas exigências de formação específica aos militares indicados.
“Ao adotarem o modelo de ensino de colégios da PM, essas escolas públicas passam a incorporar rotinas e a cultura militares. São impostos aos alunos padrões estético e de comportamento baseados na cultura militar, sem qualquer relação ou potencialidade para a melhoria do ensino. Os regulamentos disciplinares preveem que os alunos devem se apresentar diariamente com o uniforme limpo e passado, com fivela no cinto, sapatos e coturnos polidos e sem qualquer tipo de tatuagem aparente quando da utilização do uniforme, além de orientar a apresentação pessoal até dos professores e professoras”, detalha o Ministério Público Federal.
Para os alunos do sexo masculino, por exemplo, é proibido o uso de barba e bigode, além da exigência de corte de cabelo em padrão militar.
Já as alunas devem, obrigatoriamente, ter cabelo de tamanho longo ou médio, “preso em coque, com redes, a qual deve ter a cor do cabelo”, sendo vedado o uso de penteado “exagerado (cheio ou alto)”.
Os regimentos ainda proíbem o uso de brincos que ultrapassem o lóbulo da orelha e de piercings, além de limitar o tipo de maquiagem, batons e esmaltes, cujas cores e tipos permitidos são expressos. Os estudantes que não cumprirem esses padrões, inclusive fora do ambiente escolar, quando fardados, podem sofrer sanções disciplinares que podem chegar à expulsão.
Contudo, a apresentação pessoal escolhida pelo indivíduo em sua forma de vestir, adereços, corte, penteado e coloração do cabelo, maquiagem e adereços, é manifestação de sua personalidade, devendo ser respeitada pelo Estado, em razão do princípio da dignidade da pessoa humana e da inviolabilidade da intimidade e da vida privada.
Além disso, a Recomendação destaca que a imposição de padrão estético uniforme aos alunos e alunas impacta mais intensamente em indivíduos de grupos minoritários, marginalizados ou alvo de preconceito, que se veem impedidos de manifestar as características de suas personalidades e culturas diferenciadas, especialmente quanto às identidades étnico-raciais, religiosas e de gênero.
A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão alerta que, diferente dos colégios militares – que possuem público específico, com a maior parte das vagas reservadas a filhos de militares, que buscam essa opção baseada na hierarquia e disciplina, cuja finalidade é formar futuros militares – os demais colégios públicos são voltados para a comunidade em geral, composta por pessoas de diferentes personalidades e vocações, devendo formar os alunos e alunas com base no pluralismo e na tolerância, com respeito e incentivo às individualidades e diferenças socioculturais.

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